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Trajetória de vida diante dos desafios da lida no mato em Herval

26/08/2020 - 09h41min

Atualizada em 26/08/2020 - 10h47min

Há 18 anos Paulo Schneider trabalha cortando lenha de acácia e eucalipto para indústria da região (FOTO: Cleiton Zimer)

Por Cleiton Zimer

Santa Maria do Herval – Acordar cedo. Tomar café. Tratar os bichos. Pegar as ferramentas e ir pro mato. Há mais de 18 anos essa tem sido a rotina do casal Nilva Schneider, 55 anos, e de Paulo Schneider, 54 anos. Eles trabalham cortando lenha – acácia e eucalipto – que foram plantados exclusivamente para essa finalidade.

Essa produção é destinada para a Piá de Nova Petrópolis com a qual tem contrato de 600 metros de lenha por mês e, a empresa por sua vez, a utiliza na caldeira onde industrializam o leite – vários outros agricultores da região também são fornecedores. Mas, para conseguir colher essa quantidade mensalmente Paulo e a esposa têm 10 pessoas que trabalham com eles, de forma terceirizada; cada qual possui suas ferramentas próprias e recebem por metro cortado.

O dia a dia não é fácil. Na verdade, se resume às dificuldades que surgem de todos os lados, desde as condições climáticas, os terrenos acidentados e demais perigos que estão à espreita o tempo todo. No dia em que a reportagem os acompanhou entre a localidade de Alto Padre Eterno e Baixo, estavam derrubando árvores de eucalipto em um local muito íngreme e, para dificultar ainda mais, havia fiação elétrica rente às árvores que estavam cortando.

Para tanto, com o objetivo de garantir a segurança de quem estava trabalhando, tornou-se necessário amarrar as árvores com cordas e puxá-las evitando que encostassem na fiação ou que caíssem morro abaixo. Entretanto, mesmo se precavendo, Paulo conta que no dia anterior um galho acabou encostando na rede, o que deu um grande susto a todos. “De tão nervoso que fiquei mal e mal consegui almoçar de meio dia”, conta, afirmando que quando não tem essas dificuldades, em um terreno mais plano, conseguem cortar mais de 30 metros por dia.

De acordo com Paulo o tempo influencia muito. “Quando está quente e seco, é melhor para tirar a lenha dos lugares, pois, do contrário, o trator e caminhão só escorregam”. Agora, quando está um clima mais ameno é melhor para cortar a lenha.

José Carlos Backes, de 51 anos, é um dos funcionários e trabalha com eles desde março desse ano; antes, trabalhava no Frigorífico Boa Vista. Ele conta que é um serviço pesado “principalmente para a minha idade”, explica, ressaltando, porém, que é uma época em que não tem muita opção.

José Carlos Backes conta que o serviço é pesado (FOTO: Cleiton Zimer)

Almoço reforçado no mato

Nilva acompanha Paulo, faz de tudo, menos usar a motosserra e dirigir o trator; ela tira os galhos, carrega as toras organizando-as nas pilhas. Mas, ao chegar às 10h da manhã ela para e vai para outro “setor”, onde prepara o almoço de todo o pessoal. A cozinha fica no meio do mato, entre algumas árvores, em um local arejado e com bastante sombra. Ali ela tem suas panelas, pratos, um botijão de gás, fogareiro, um fogão feito de pedras para manter a comida aquecida e, até mesmo, uma churrasqueira que ela montou, já que ficam bastante tempo no mesmo lugar.

Ela conta que, na maioria das vezes, faz almoço para sete pessoas,pois nem sempre todos trabalham no mesmo lugar. E o cardápio é completo, de seis a sete tipos por dia; tem vezes que até sai um churrasco, galetinho e salsichão. “Comida não pode faltar; é preciso se alimentar bem, é um serviço pesado”.

A louça é lavada ali mesmo, pois água em abundância é o que não falta.

Nada é difícil ou pesado de mais, até mesmo para Nilva, que ajuda carregando as toras de madeira (FOTO: Cleiton Zimer)

Previsão do tempo

Nilva revela que para o trabalho deles é fundamental ficar atento à previsão do tempo pois, é através dela, que se organizam ao longo de uma semana. Quando indica que será chuvoso, vão trabalhar em outra propriedade, onde possuem uma cabana perto; agora, quando aponta para tempo seco, vão para esse local onde a reportagem os acompanhou, pois ali estão só eles e o mato.

Questionada como faz quando começa a chover de surpresa enquanto faz o almoço, conta que não tem problema. “Chamo um ou outro homem para me ajudar, prendemos uma tora de madeira entre as árvores, jogamos uma lona por cima e a cabana está pronta; nem nos molhamos”.

Gostar do que se faz

Nilva afirma que o serviço com a lenha é pesado, mas que gosta e que não pretende parar. “Enquanto eu conseguir, vou fazer. É difícil, mas, a gente está acostumado”. Para ela é bonito trabalhar na roça levando em conta a liberdade que proporciona, além de sempre estar na companhia de alguém que é algo que não teria se fosse apenas dona de casa. Menciona que no trabalho deles todos se entendem e “isso é a melhor coisa que tem”. Conta que uma mão sempre ajuda a outra, pois cada um vê o serviço que precisa ser feito.

Ela diz que ao chegar em casa de noite, depois do serviço, se sente bem mesmo tendo tido um dia de trabalho pesado. Eles tomam um chimarrão, arrumam uma coisa ali e outra aqui e, assim, vão seguindo na lida diária. “Sabe, estando com saúde ou não, ficar em casa é sempre pior. Todos nós temos problemas nas pernas, devido ao serviço pesado, mas o corpo está tão acostumado que, quando não trabalhamos por dois ou três dias parece que sentimos falta”.

Nilva em sua “cozinha” adaptada no meio das árvores (FOTO: Cleiton Zimer)

 

A cozinha é simples, mas olhando bem, tem de tudo (FOTO: Cleiton Zimer)

Uma história muito maior

Paulo trabalha com lenha há mais de 18 anos, junto com sua esposa Nilva (FOTO: Cleiton Zimer)

A história de Paulo e a esposa é de muito trabalho. Em 15 de abril de 1999 começaram a fazer coleta de leite em Herval para a Piá, sendo Paulo o leiteiro do município até 2012 quando sua filha e genro assumiram; dessa forma, ficou somente com os fretes da lenha. Essa trajetória será contada em uma segunda reportagem.

 

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